Quero exibir a minha humildade. Desnudar-me como ser sensível. Mostrar os meus limites. Aparecer perante vós como Egas Moniz perante o rei, com uma corda à volta do pescoço...
Talvez porque quem me leia julgue arrogante-me, ao fim de uns quantos textitos enviados para o éter.
Aliás, nem seria necessário ir tão longe… Basta a minha apresentação, baseada numa realidade coberta por uma cortina que olhares mais atentos conseguem gentilmente afastar. Contudo, é pequeno um texto que assumo, e sublinho.
Considera-me. E simultâneamente desconsidera a minha sorte, a qual obra minha, como todas as sortes.
Os maiores generais do exército romano eram cotados segundo esse factor, que para um homem do séc. XXI é um pedaço de superstição… a tal da sorte. Normalmente a ela me refiro como sendo algo que dá muito trabalho…
Ok. Aqui vai o meu pescoço. Façam o que quiserem com ele:
Não consigo valorizar favorávelmente Manuel de Oliveira.
Já o tentei, aliás, de forma recorrente.
Convém aqui clarificar algo importante. Existem no meu universo dois tipos possíveis de juízos a efectuar na presença de algo: juízos de valor e juízos de gosto.
O meu gosto, esse raramente é chamado para situações que envolvam terceiros, como é o caso. Trata-se de coisa privada.
Resta a minha capacidade para ajuízar o valor de algo.
E o meu juízo de valor sobre o trabalho de Manuel de Oliveira é o mais negativo que se possa conceber.
Levei durante um quinto da minha existência com uma carga brutal de História de Arte. Na minha vida académica fui obrigado a transformar-me num bom juíz de valores, porque afinal iria necessitar disso para me distanciar e medir a qualidade do meu próprio trabalho e dos que iria orientar em seguida.
Embora sendo capaz de avaliar a qualidade de qualquer manifestação artística, por altura da sua imediata emergência e atribuir-lhe mesmo, valores na escala de um a dez, zero a vinte, ou zero a cem... chego ao Manuel de Oliveira e atribuo um Zero, bem redondo.
Mas devo estar, ou ser maluco.
Doido varrido. Ou então, quiçá, estarei a brincar...
Afinal ele é conceituado... Bastante...
Cotado... Muitíssimo cotado... Michel Piccolli, Catherine Deneuve, Luís Miguel Cintra... tudo se encontra à sua disposição... Inclusive o Palco de Cannes, para onde o senhor sobe sem ajuda e lhe é concedido o tempo necessário para ele proferir a banalidade que quiser ( viram o Benvindo Mister Chance, com o Peter Sellers?). Aliás, nem acredito que ele peça subsídio algum. Aparecem-lhe naturalmente, alguns euros dos que me são retirados todos os meses, na sua conta bancária para fazer o que bem entender na tela...
Não. Não estou a brincar. Escrevo isto muito a sério e de forma grave, e até mesmo triste. E não é comigo que estou triste. É com tudo... A obra de Manuel de Oliveira é mesmo má. Ou seja... o rei vai nu.
Agora tenho que o provar. Não se afirma nada deste calibre... sem provas.
Não é preciso ir muito longe, nem sequer ver algum dos seus filmes, para isso.
Eu cá sou como o Michelangelo, que afirmava que "Deus está nos detalhes". Divindade à parte, é mesmo pelos detalhes.
A ver:
O trailer do último filme.
Um casal detém o carro numa aldeia para pedir informações. Acerca-se da viatura uma suposta aldeã. Ao falar, a personagem dilui-se como água na percepção ruidosa que temos de que... aquela criatura decerto nunca se encontrou em aldeia alguma...
Non, ou a vã glória de mandar.
Pensava eu que era daquela, com aquele filme, que iria mudar o meu parecer. Sou um apaixonado por História e principalmente pela do conflito.
Mas...credo. Cada calinada! E tudo sem sair da batalha de Alcácer-Quibir...
Ele é os soldadinhos com a roupinha acabada de passar a ferro com os vincos bem visíveis, branco mais branco não há...
Ele é as cargas de cavalaria, random, ora para um lado, ora para outro...não houve deserto que escapasse...
Ele é as bolas de ténis pintadas a imitarem balas de canhão que ressaltam e tocam num dos figurantes que caiu com um boneco...pum estás morto...
Enfim. Tudo muito mal feito. E não se desculpem com o Godard, tudo nele era intencional... Aqui não, é apenas falta de...
Aniki Bobó, afinal ele fez o Aniki Bobó.
Ok. É um filme que teve a sua graça. Pena é ele não ter continuado a evolução da dita, nos seguintes...
A Caixa. Valeu-lhe o argumento e principalmente o Luís Miguel Cintra...
Aprecio todo o tipo de cinema. Procuro especialmente o cinema de vanguarda ( não existe essa definição, mas entenda-se que para mim é o que tenta acrescentar algo...) e apercebo-me imediatamente da qualidade de cada um.
Por exemplo, chineses, e principalmente coreanos estão neste momento a criar cinema fabuloso, de cortar a respiração!
Dentro duma linguagem aproximada à do senhor que aqui abordo, temos o Andrei Tarkowsky.
É impressionante a comparação: um deus ao lado dum morto...
O artistas cuja qualidade considero, trato-os pelo primeiro nome. Foi assim que me referi ontem a Rui Macedo, João Pedro Mateus e a Susana Pires.
No Porto temos um artista fabuloso que não se coíbe de mostrar a sua excelência cerebral: O Pedro Abrunhosa.
Temos uma Joana Vasconcelos, que ainda vai dar muito que falar, certamente.
No cinema, uma Teresa Vilaverde, para a qual não me importo que vá o dinheiro dos impostos que pago. Trata-o bem, criando coisas de real qualidade.
E há outros... mas o establishment...
Na verdade, o que ele, Manuel de Oliveira sempre quis, sei eu: a gloriosa simplicidade, com toda a sua subjacente sofisticação. Mas como todo aquele que a procura e não é Capaz, a única coisa que encontra...
...é a pobreza...
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13 comentários:
Por incrível que pareça não me posso pronunciar sobre o assunto... nunca vi nenhum filme de Oliveira!
afrika
Não é incrível.
Nunca NINGUÉM viu nenhum filme de Manuel de Oliveira...
Olha eu tb nunca vi e espero não ser obrigada a ver...
Mas deve ser uma pessoa fantástica para conversar.
E tb não gosto do Saramago, que me perdoem todos os que gostam.
Então desde que ele disse que deviamos ser uma província de Espanha nem como pessoa o admiro.
ju
Nunca ninguém viu, e eu já me desloquei ao cinema para o ver. Mas o homem é um incompetente. Não se trata de gostar ou não. Também gostava (agora não) de bife com batatas fritas e considerava aquilo um erro alimentar...
O Saramago é outra história, com o seu interesse em explorar...
bjinhos
Vi um único filme do MO, o Aniki bobó, há muitos, muitos anos atrás e por aí me fiquei. Por essa razão, o meu comment vai limitar-se à analogia.
Adoro ler. Devoro livros. Leio de tudo um pouco, dos clássicos aos modernos, do romance à ficção cientifica.
Já tentei, juro que já tentei, umas oito vezes pelo menos, ler o Saramago e não consigo digeri-lo para lá das primeiras 15 ou vinte páginas ...
Não vale a pena. Eu sei que tem prémio Nobel, eu sei que é mundialmente lido e traduzido, mas aqui esta humilde leitora não foi certamente bafejada pela sorte de o compreender...
A revista Actual do Expresso de hoje, dedica duas pequenas colunas aos referidos Senhores, lado a lado nas páginas em causa, são ambos elogiados (uma vez mais) com eloquentes e rasgadas críticas de tapete vermelho ... mas, uma vez mais, de rabinho entre as pernas, repito, não entendo!
mlee
O rei vai nu. E mai nada...
existem valores instituídos e quando o estão, nem sequer se questiona a sua qualidade. Mais uma vez pergunto, viram o Benvindo Mr. Chance?
Eu já vi vários filmes de Manuel de Oliveira e leio regularmente Saramago. Passa-se alguma coisa comigo e eu não dei por ela????
Bjo
M&M
Não há regra sem excepção, querida excepção :-)...
Agora a sério, acredito que os tenhas visto. Eu é que sou um avaliador do piorio... E fssst, vou logo ao que está instituído...
Quanto ao Saramago, não veio pra este espaço desta vez por minha iniciativa e difícilmente virá...repito, é outra história. E para variar, com bastante interesse.
Mas goste-se ou não...Saramago tem muita qualidade... Mas não era o gosto que imperava aqui...
Bjo
Rocket e M&M (sorry, pelo aproveitamento de espaço, meu caro), a minha reacção ao post, foi, como sempre, instintiva, ou seja, dei por mim a dizer a mim mesma, "olha, olha parece eu com o Saramago". Mas digo e repito, a qualidade literária do escritor é mundialmente reconhecida, por isso, a "deficiência" é minha certamente ... Já quanto ao MO, não tentei sequer o suficiente para me manifestar :) Beijos a ambos.
mlee
Tudo bem pelo que me toca. Quanto ao Saramago não é necessário repetir-me, mas posso acrescentar algo. Ao longo do seu percurso, evoluiu como escritor, e tal evolução nem sempre é acompanhada por quem o lê. Mas iso faz parte da filosofia de criação artística. O Picasso aos quinze anos pintava como uma máquina fotográfica e a partir daí partou para a descoberta, que é a responsabilidade de qualquer artista...
Em relação ao Manuel de Oliveira, o meu primeiro texto, depois revisto, aludia a uma possível incompetência da minha parte na análise de qualquer fenómeno cultural. Foi revisto e abdiquei dessa dúvida por ela não fazer sentido: analizo com precisão qualquer fenómeno artístico emergente e "cheiro" a qualidade com eficiência, comprovada pelo acompanhar ao longo dos anos daquilo que adivinho.
O sr. Manuel de Oliveira lá terá as suas qualidades, mas o que é certo é que na tela elas não aparecem. Além dos exemplos de falta de profissionalismo puro que dei, existem outros mais técnicos, onde ele pura e simplesmente se descuida.
Ritmos de acção errados, discrepância dos mesmos, a destruição de argumentos, alguns bons, por uma procura ineficaz da simplicidade que redunda no encontro da pobreza que mencionei.
Se eu trabalhasse assim, deveria estar a viver ali debaixo dum vão de prédio ou a pedir casa ao estado...
E o que é grave, é que é do meu trabalho e do teu, mlle. que é paga alguma da mediocridade (sou benevolente, um coração de manteiga...) que se exibe nos cinemas.
Com muita Pompa.
Só por curiosidade... O tubo de escape na foto é uma alegoria à tua opinião dos filmes do Manoel de Oliveira?
magucha
O tubo de escape da foto não é uma alegoria à minha opinião dos filmes do Manuel de Oliveira.
À minha opinião...não.
Aliás. Quando se elaboram e enunciam juízos de valor, o resultado nunca é uma opinião...
criptográfico, eu? :-)
bejinhos maguchinhos
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