sexta-feira, 7 de março de 2008

"My God...Is Full of Stars"!...

Até há pouco, intrigava-me o facto dos maiores astrofísicos confessarem-se profundos crentes na existência do sobrenatural. Porque sendo cientistas, parecia-me um contrasenso.

E porque carga de... ÁGUA... é que, a mim, me parecia um contrasenso?

Vão buscá-la à cozinha... a sério. Um copo cheio. E tragam também um vazio...vais ser necessário, para a explicação (é aliás, o mais importante dos dois).
Coloquem-nos lado a lado.
Mas observem bem o copo vazio. É aí que a acção vai decorrer...

Um copo cheio de nada. Foi o que o homem primitivo encontrou, na natureza em que habitava.
Bem, ainda não existiam copos como aqueles que estão à sua frente, mas como o cérebro tem uma certa dificuldade em lidar como conceito de vazio, toca de o encher com algo. Foi o início da Filosofia.
Assim, tudo o que acontecia, tudo o que o rodeava, era tão maravilhoso, tão elaborado, tão magnífico, que o nosso homem primevo teve logo que arranjar justificação para todos aqueles cookies naturais com que era brindado, mesmo os que o assustavam. Assim, a cada maravilha, ia associando um criador-gestor da mesma... ao fogo, à água, ao sexo... foi assim que nasceram os primeiros deuses, que eram quase como patrões de tudo o que o transcendia. Verificamos isso, que considero algo muito bonito, nas sociedades primitivas.
Aliás, sobrenatural e criação estética têm sido uma recorrente e constante associação... ainda bem.
Depois, e porque certos cérebros, que como o meu, têm a tendência para procurar o flanco das coisas e tentar desvendar os seus segredos, houve gente que começou a associar ideias, a experimentar e a chegar a conclusões sobre muitos dos mistérios anteriores.
Nasceram o Método Científico e... a Ciência.
Essas conclusões, após aprovação geral da civilização vigente, transformaram a Ciência em algo um pouco mais engravatado, pomposo: O Conhecimento Científico ( existe Outro, mas já lá vamos...)

Olhemos para o copo cheio. O que está lá dentro, a água, vamos considerar Conhecimento Científico em bruto.
Vamos pegar nele e despejar um pouco desse Conhecimento Científico dentro do copo vazio: meio-dedo.
Agora podemos criar uma relação: O meio-dedo de água presente no copo refere-se a parte da realidade que rodeava a gente que começou a associar ideias, a experimentar e a chegar a conclusões sobre muitos dos mistérios: o Conhecimento Científico.
A parte vazia do copo, bem maior, é aquela que ainda está preeenchida pela realidade sem explicação.

Não ficou sózinha e abandonada. O homem deu-lhe um cunho esotérico, mágico...sobrenatural.
Consoante a civilização ia amadurecendo, assim o copo se ia enchendo um pouco mais de Conhecimento Científico e ia encurtando o espaço vazio do sobrenatural (podem ir enchendo o copo, e acompanhando a conversa).
Até que chegámos a um ponto em que o copo já está com uma certa quantidade de água e com menos espaço vazio. É o ponto, em que graças ao Hubble, começaram a olhar para mais longe, os astrónomos e os seus gurus, os astrofísicos...

Convém interromper esta metáfora. Considero, nesta dissertação, sobrenatural algo que, sendo mistério, para o qual se arranja a explicação que está mais à mão da conveniência do poder terreno que nos rege.
Não estou, de todo, a referir o Divino.
O Divino é estudado por gente de bem. Não existem meras e prosaicas conclusões, como no âmbito da Ciência. Existe um Saber sobre o mesmo. Mesmo os seus mistérios, acarinhados, pertecem a esse Saber...
A forma de o atingir não será aqui abordada, por mim. Não sou, de todo, digno... muito simplesmente.

Continuando com os astrofísicos...
Pois é. Completamente dominados pela ideia do sobrenatural (para mais com aquela, baratucha, do "algo superior a nós"...como se isso fosse extraordinário, existir algo superior ao lixo de carbono que somos)...
Sendo cientistas, como é possível?
A explicação é simples. Até agora, um laboratório era apenas uma cozinha mais sofisticada, com copos como os que estão em cima da mesa, um pouco mais retorcidos. Em vez da porta do frigorífico, onde se escreve a gestão do activo e do passivo da cozinha, um quadro negro com fórmulas matemáticas onde se faz o mesmo com o Conhecimento Científico. E computadores, em vez do micro-ondas.

O Hubble, entre outras factores, veio alterar isso tudo. Lançou toda a gente num cosmos de dúvidas, e agora, um astrofísico sente-se exactamente como o homem primitivo, ao observar todas as maravilhas que o intrigavam... Rodeado por deuses.

...A observar um copo completamente vazio.


Foto: Nebulosa de Orion (Hubble)

11 comentários:

alfabeta disse...

Todos temos que acreditar num poder superior e mesmo aqueles que dizem não acreditar em nada , quando estão aflitos, por quem chamam?
A velha expressão, Óh meu Deus!!

Pois é, e depois dizem que não acreditam!

Rocket disse...

aalfabeta

Não é, de todo, difícil acreditar num poder superior. Basta observar os nossos parcos limites.
O que aqui revelo é como de repente a ciência se encontra esmagada pelo que se vislumbra através dum tubo no espaço. E como de repente, os velhos deuses dos rios, das florestas e os conceitos totémicos se aplicam ao homem que observa aquilo que a o véu da atmosfera deixava apenas adivinhar...

bjs

Rui Caetano disse...

TEmos de acreditar em nós, na nossa força , nos nossos sonhos, mas não podemos abdicar em acreditar em algo diferente dos humanos, como não sabemos nada do além, não nos resta senão imaginar e crer.

Rocket disse...

rui

Como não sabemos nada do além, temos que lá ir, para saber. A meio do texto existe um parágrafo que trata disso. Existe quem lá vá e lá chegue...
Há várias formas de lá ir. temos é nos por a caminho. É obrigação nossa, agora ficarmos siderados a quietos... A imaginação é coisa boa, guardemo-la para criar...
E acreditemos naquilo que seja digno de tal. nada mais... Eu, embora o texto seja ambiguo, acredito. Não digo é em quê...

um abraço

Afrika disse...

"o que ainda ontem era milagre"... foi um dos livros que li,na minha infância. Onde se pode ler sobre as descobertas da ciência em relação as superstições e crenças. Diz-se que a ciência não acredita em Deus... porque sera ?! Talvez por ter encontrado uma explicacao "logica" pra tudo ou quase tudo, dai a fé da humanidade em relação ao "desconhecido" tornar-se mais céptica ... desaparecera a fé da humanidade?! Deixara esta de acreditar na "força" Superior?! No dia em que o Homem conheça todos os mistérios do universo este deixara de existir! ou se transformara, como só a matéria é capaz de o fazer (voltando a um principio) e continuara a surpreender- nos...

Rocket disse...

Afrika

É quase uma síntese, o teu coment ao meu texto.
Contudo afirmo que o nível de conhecimento, quer científico, filosófoco ou religioso, que se possui, não é aquele que nos querem impingir, que para certas existências torna-se confortável. E, pegando na metáfora dos copos, haverá gente que sabe o que se encontra dentro do vazio do copo e que mesmo ele se encontre completamente cheio, conheça melhor a água que o enche que quem o encheu...

Bjiiinhos

Leonor disse...

Meu caro,
Um post delicioso. A minha mãe é formada em fisica/quimica e o meu pai (engenheiro e militar de formação) tem um absoluto fascínio por ciência e por informação relacionada com o cosmos, por isso, há coisas que lá em casa eram conversa de almoço :)
O teu texto tem um aspecto interessante - assume a premissa da fronteira (que depois esbates) entre a ciência e o sobrenatural (dá vontade de separar o vocábolo "sobre - natural"). Não é só para o lado do cosmos que os copos aparecem vazios, no sentido oposto, o da fisica quântica, os copos permanecem no mesmo estado e em qualquer das duas direcções é o inexplicável que faz a ciência avançar à velocidade alucinante que o tem feito e, por outro lado, encontrar respostas que, por vezes, poêm em causa todo o percurso ciêntifico/racional percorrido. Cresci com a noção de que tanto o cosmos como a ciência do ínfimo (a fisica quântica) são campos que podem, a qualquer momento, diluir as fronteiras não necessariamente em relação ao religioso, mas a algo mais esotérico que, a partir de então deixará de o ser para dar lugar a algo mais ... é um percurso sem fim!

Rocket disse...

mlee

São as dúvidas, e não as respostas o tema do texto, e o efeito que elas exercem em quem busca respostas. Observo, posso estar enganado, a tal reverência que refiro, considero-a nociva porque é um convite á imobilidade, como o foi o período da idade média, em que tudo era explicado com o metafísico.
Em relação à física quântica, imagina um Hubble que se lhe aplique. Não os aceleradores de partículas, não o plasma, mas algo que ponha tudo realmente de pantanas, e verás decerto gente de bata branca com ossinhos à volta do pescoço dançando ao redor de fogueiras...
Então quando se começarem a descobrir as outras dimensões...ui ui

Leonor disse...

Rocket,
É claro que te referes às dúvidas e nãos às respostas e, nessa medida, só quis acrescentar mais umas quantas ... No fundo o que digo é que talvez não haja assim tantas fronteiras e nesse caminho temos à nossa frente um oceano de dúvidas, muitas delas, para já, inqualificáveis porque se calhar não cabem sequer naqueles que são actualmente os nossos conceitos ... é quase o tal "meter tudo de pantanas" a que te referes ... não há fim para isso.

Rocket disse...

mlee

Tem que haver, a nossa sobrevivência como espécie vai depender disso. Não estaremos sempre sózinhos... como agora.


bjinhos e obrigado pela interacção

Maísa disse...

Ai cum caneco, eu não deixei um comentário aqui?
Onde é que ele foi parar?
Beijinho.