sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Carta para Peões


Eu cá, ando de transportes públicos sempre que posso. De Metro, convém especificar. Porque Metro e autocarro são distintos: quem é freguês do Metropolitano de Lisboa partilha-o com todo a variedade humana mas o ratio de pessoas civilizadas é, ainda assim, relativamente aceitável.
Num autocarro nem é preciso entrar. Inserir-se na fila ganha contorno de começo de viagem interplanetária... e os planetas que conheço, além do nosso, não possuem atmosfera respirável…
Mas não é de transportes, a conversa de hoje. O metro veio a propósito, porque mal lá chego levo sempre com os mesmos conteúdos em formato diferente, nos matinais borliús,
Hoje o assunto da tituleira-mor era o das apreensões de carta.
Parece que vem para aí uma nova legislação. E isto porque como todos sabemos, devemos ser o país da UE com pior condução e maior nível de acidentes. As novas leis vão criar mecanismos automáticos de apreensão de carta aos condutores mais prevaricadores...Pareceu-me...

… Hum, Sei lá…só li as gordas, por isso estão à vontade para me corrigir ou definir o assunto em si.
Mas também não é por isso que estas linhocas aparecem aqui.

É por uma repetida e conhecida setença: antes de saber correr é necessário saber andar.
Isso mesmo. Saber andar. E para quem já andou em muito lado, a impressão de quem chega a esta bela cidade é a de que o povo não se sabe locomover duma forma civilizada. Não sabe andar. Nem estar quieto. Porque mesmo quem joga sem bola também faz parte do jogo ( lembram-se do Yuran e do Kulkov? Nunca nela tocavam, mas como tinham sempre a defesa toda em cima deles, abriam-se brechas para outro caramelo marcar os golos…).

Problemas: Gente que anda em trios de tertúlia a varrer os passeios, gente que se atravessa à frente dos carros e depois ainda insulta a mãezinha dos condutores obrigados a travagens bruscas, gente que nas escadas e passadeiras rolantes se junta aos pares e impede a progressão de quem vem atrás, com um ritmo um pouquinho mais acelerado, porque alguém tem que trabalhar neste país... Gente que escarra com uma sonoridade aterradora, que joga lixo fora, que fala alto ao telemóvel (apanho cada susto), Gente que se comprime em parede humana em frente às portas do metro a impedir a progressão dos que desembarcam ( autênticos Omaha Beach)... Enfim...

E o pior é que esse mesmo povo entra nos automóveis e se comporta exactamente da mesma forma exemplar.

Lá fora...À saída de carro do JFK, em Nova Yorque, leva-se logo no primeiro cruzamento com um sinal de stop com duas tabuletas agregadas, uma onde está escrito YOU STOP HERE, e outra com a seta a apontar o HERE referido... Isto é comum na filosofia subjacente a toda a sinalética americana.

Em Londres, quem anda de metro ouve sempre as mesmas cantilenas: ...MIND THE GAP... KEEP RIGHT... (nas passadeiras e escadas rolantes, segundo o mesmo princípio do trânsito automóvel)

Em Bruxelas chega-se ao cúmulo de se lerem avisos, nas passadeiras, de que o fim da mesma está a quinze metros: LA FIN A QUINZE METRES...

Enfim, conta-se por esses lugares de que se tratam de caridosos apoios para quem se desloca, porque as pessoas vão distraídas...
Por aqui também o andam, mas eu tenho outra solução (Isto de dizer mal e de não apresentar soluções não é comigo).

É esta: Quem, a partir de idade a designar, se quiser deslocar pelo seu próprio pé em lugar público deve fazer-se acompanhar de documento oficial, passado por autoridade competente, comprovativo da capacidade de exercer tal acto sem prejuízo da segurança, fluidez de trânsito pedonal e automóvel, higiene e outros requisitos a definir.

À imagem duma carta de condução automóvel.

Vantagens: criam-se milhares de novos postos de trabalho com a emergência de centenas de Escolas de Locomoção Pedonal. O Estado, em consequência, arrecada uns valentes biliões em impostos... isto sem falar no inevitável aparato de repartições da novíssima Direcção-Geral de Locomoção Pedonal, apoiada por vários outros organismos satélites.
E os advogados? Que lufada de ar fresco no sector...
E os seguros? teriam que ser naturalmente obrigatórios, os de responsabilidade civil contra terceiros...Isto sem mencionar o novo imposto de selo para circulação pedonal...obrigatório, na lapela.

Haveria outras coisas menos simpáticas, como Operações-Stop no meio da rua, para verificação da conformidade de tudo isto ...Mas como não há Bela sem Senão...

Enfim... E eu não teria que andar aos "colicenças" contínuos cada vez que me desloco numa escada rolante, e, mais importante, este tipo de locomoção segura iria reflectir-se na condução automóvel, certamente melhorada a um nível jamais visto...

Como querem ter um país de bons condutores com peões assim?

13 comentários:

Maria Manuela disse...

Esqueceste os que coçam as partes pudibundas em público e a seguir cheiram !!! Esses também contam…

Rocket disse...

Multa de 100 euros para cimas deles, como vês já penso em multas e tudo...ah ah ah

Anónimo disse...

Como te compreendo...eu ando de metro todos os dias e deparo-me com pessoas civilizadas. Mas sempre que ando de autocarro, infelizmente são poucas vezes, é só gritos e confusões...até chapadas!

Rocket disse...

lovely miss d

E nem é necessário entrar no dito cujo... Basta embarcar na fia de espera...

Leonor disse...

Peões e condutores, não é uma questão de Leis, mas de mentalidades. Estas e o civismo não nascem de um dia para o outro à da execução de uma norma, leva mais tempo, o tempo de uma ou duas gerações ...

Rocket disse...

Mlee

As leis eram por graça, claro. Não te assustes! Já chegam as que nos assolam...
Parte tudo da iniciativa de querer mudar, de querer... melhorar. Mss para isso temos de ter consciência bem definida de como estamos, do que combater...
Ainda ouvimos por aí um termo que considero vergonhoso mas que traduz a nossa triste subalternidade:... "Para inglês ver..." Felizmente usa-se cada vez menos, e espero que uma ou duas gerações bastem, como tu tb o esperas para o eliminar completamente, assim como outras coisas aqui mencionadas. Nem tudo é mau... as pessoas já começam a usar os caixotes de lixo públicos e algumas já trazem saquinhos para as necessidades caninas...

Rocket disse...

Plus... Quando Claude Lévi-Strauss (o antropólogo) chegou à Amazónia, decadas atrás, deparou-se com sociedades quase perfeitas, as primitivas, que para ele eram motivo de estudo: As pessoas não eram escravas de nada, trabalhavam para o estritamente necessário que lhes ocupava uma parte limitada do dia... o resto passam-no a brincar, em riachos, a rir, a fazer amor e e afagar a crianças, que nunca eram agredidas. Em suma, a serem felizes...
Caracteristica curiosa: ausência total de leis...

Gaja Boa 1 disse...

O engraçado é que existem coimas para os peões infratores, mas eu nunca vi por exemplo um peão ser multado por não atravessar na passadeira quando esta está a 3 metros dele...

Enfim!!!

beijos multados

Rocket disse...

Gaja Boa 1

E quantos polícias eu não vi já a fazerem o mesmo?
O que referes na Dinamarca, é impensável!

Magucha disse...

Faltou-te referir os pais que, estando a criancinha à espera do peão verde para atravessar, a obrigam a atravessar à balda... Acho que deverias incluir na nova legislação uma proibição de os agentes não autorizados ensinarem a andar!

Rocket disse...

Magucha

Obrigado pelas dicas. Vai tudo ficar em casa até aprender a andar na rua...
Formação tipo Telescola, podes começar a pensar nos patrocínios... A economia vai andar num virote...

bjs

Anónimo disse...

E aquelas velhas que andam no meio do passeio, e está um gajo a tentar passar pela esquerda e pela direita, quando elas se assustam, agarram firmemente a carteira e ficam logo com aquele olhar de "ai o larápio já ia meter a mão à carteira!"?

Rocket disse...

vb

É um nunca acabar de bons exemplos...