
Nunca odiei ninguém.
Já pensei ter odiado antes... mas não, não era ódio.
Isto dos blogues faz lembrar um pouco o
Speakers'corner do Hide Park, onde cada um tem o seu palanquezito, e sobre ele empertigado, manda os seus bitaites, como agora o faço, embora estes
bytes permaneçam bem para além da vibração do ar em frente da boca dos
speakers. Podemos a eles ter acesso em qualquer momento, no quentinho das salas onde temos os nossos computadores.
Com calma. Com tempo. Mente e canais abertos...
O ódio...
Circulam nesta nossa
blogocoisa desafios aparentemente inócuos em que a temática é o ódio. Parecem inocentes. E quando chegam, quem lhes pega devora-os logo como um carnívoro ataca um bife, a rosnar:
"Eu odeio gente assim/gente assado, convencidos, emperuados, mentirosos, o galo do vizinho, o zé da esquina, pretos, homossexuais, judeus, árabes, ciganos, romenos, ratos, mestiços, brasileiros, russos e ucranianos, tchetchenos, gajos que têm sempre razão, gajas que não me dão o pito quando o dão ao vizinho, vizinhos que dão o
lolypop à outra mas não à escrevente, invejosos, a proibição de fumar, os gajos que fumam para cima de mim, a asae, os restaurantes porcos com baratas"...
Eu cá não odeio nada nem ninguém. Nem sequer o próprio ódio.
Mas não sou nenhum menino. Quem mas faz paga-mas.
Aliás, sem ser capaz de odiar, sou pragmática e eficientemente vingativo.
Mas sou-o por justiça. Por uma justificada necessidade de repor equilíbrio
...é uma coisa, assim, de... Yin e Yang...
Muitas vezes a própria vingança é ficar quieto, e deixar que as coisas aconteçam por si.
As últimas que me fizeram foram cobradas, e bem, assim. Na última nem fiquei para assistir, tão óbvio o resultado...
Mas se é necessário mexer-me, então isso acontece. Mas friamente, sem paixão, com elegância, sem ódio, com cirúrgica eficácia...
Por exemplo: o homem mais habilidoso que conheço a andar à pera, despacha-os, à meia-dúzia, sem qualquer emoção...
O ódio é um péssimo comburente para a eficaz combustão duma vingança ou de qualquer outro acto determinado. Porque a sua essência é o medo. E o medo é só o passo atrás que se mostra convidativo...
Quem odeia, habitualmente, é sempre gente boa.
Conheço muçulmanos que fariam tudo por mim, embora eu conheça os seus ódios adormecidos.
Na tropa dava-me sempre com malta do Norte: era a mais fixe. Sempre. Mas no que tocava a ódios, transfigurava-se, quando se falava do Sul. A mãe da minha cria é de lá, e com ela passava-se o mesmo... demorou década e meia para diluir o ódio que tinha a isto.
A minha cria veio de lá após o secundário, à espera de encontrar na capital um espírito mais aberto. Mas eis que, numa escola perto da Avenida de Roma, ela se depara com uma dose de racismo, xenofobia e homofobia que de todo não contava. Bem, os colegas são uns porreiraços, mas também são isso tudo.
Vocês também são uns gajos muita fixes, mas, nos blogues de alguns, li, preto no branco, que odeiam...
Uma coisa é embirrarmos com algo, ou alguém. Por exemplo, eu embirro com o ódio. Só não embirro com peúgas brancas porque o Michael Jackson (com quem embirrava) se desmembrou. A embirração é um sentimento simpático e elegante. E, sem uma pinga de ódio, colocamos num delicioso ridículo aquilo com que embirramos.
Agora o ódio... é uma manifestação agressiva de medo.
Ontem num blogue, alguém teve a coragem de publicar um filme onde é assassinada uma mulher em nome da
Xaria, a lei islâmica. Ela tinha quebrado um dos preceitos, julgo que o adultério (embora o
blogger desse outra justificação). É um filme horrível em que ela é apedrejada até à morte. Quem o faz, na multidão, tem o cuidado de, estando ela no chão a levar com pedras e tijolos, lhe cobrir as pernas com as saias que de quando em vez se levantam... Tudo acaba com um enorme bloco de cimento...
Quem faz uma coisa destas fá-lo por medo.
Medo que lhe aconteça isso no seio da sua família, da sua comunidade... E quem odeia nunca comete a maldade movida pelo ódio, a solo. Precisa sempre de companhia...
Eu conheço o medo. Não por o ter... mas por o ver estampado em rostos alheios.
Vejamos. A nível profissional, quantas vezes não fui considerado uma ameaça?...Sempre, talvez... tanto medo...
A nível moral...
Vamos aos valores. Não sou nenhum menino de coro mas prezo muito certos valores. Caldo entornado. Lá vem
the boogie man...
E quando entro, sózinho, numa festa? Ui! É vê-los a agarrá-las, a enlaçá-las, a reclamá-las, com o ódio estampado no rosto. E a estupidez?... porque não percebem que a coisa funciona ao contrário. Qualquer gajo que entre desacompanhado é olhado com desconfiança pelas mulheres. Isso do James Bond... só nos filmes. Um homem só, num sítio público, para qualquer mulher representa "perigo"... mas não daquele romântico... Ao agarrá-las, e ao demonstrarem posse, eles despertam apenas uma curiosidade morta à nascença...
No ginásio há lá um casalinho nas aulas de
Body Pump. Ela, uma brasa, cumprimenta-me efusivamente, ele cumprimentava-me... antes de ver a quantidade de peso que coloco...agora parece um animal a tentar competir comigo, e nos intervalos dos exercícios não a larga com as manápulas à volta da cintura. Não me saúda, rosna-me um olá, a tirar-me as medidas.
Quem odeia é sempre gente boa. E os motivos também são fixes. Odeia-se em nome da Moral, dos Bons Costumes, do Senso Comum (que é uma espécie de nivelamento pela mediocridade). Odeia-se em nome do Amor. Odeia-se em nome de Deus...
Parem de odiar.
Foi gente como nós, movida por esse sentimento, que matou atrozmente aquele senhor que aparece crucificado nos altares...
...que agora é amado como ninguém...